As altas habilidades/superdotação
(ahsd) não significam apenas alto desempenho, rapidez para aprender, interesses
por temas mais avançados para a
idade... Na verdade, é um universo mais amplo: envolve não só a parte
cognitiva, mas também algo chamado assincronia
no desenvolvimento, quando a
criança/adolescente ahsd apresenta um alto desenvolvimento em uma área e em
outra não apresenta o mesmo nível; e pode
acontecer algo chamado sobre-excitabilidade, onde temos a alta intensidade emocional.
Esse olhar mais amplo e qualitativo foi
possível graças a contribuição de diferentes pesquisadores, como Dabrowski
(1972), Terrassier (1979), Silverman
(2002), e as brasileiras Virgolim (2007), Landau (1990), Alencar (2007), Fleith
e Ourofino (2011), difundindo em nosso país tão importantes conhecimentos na área por meio de publicações.
O que tem no universo ahsd |
O que pode acontecer |
Dicas psicopedagógicas |
Assincronia no desenvolvimento: Quando
diferentes dimensões no desenvolvimento da pessoa com altas habilidades não se dão no mesmo nível, no mesmo ritmo. |
Exemplo 01: A
pessoa se destaca muito bem em uma
área, como Geografia, e pode ter um desempenho fraco
ou bem fraco
em Português. Exemplo 02: Tem alto desempenho em pesquisar e aprender com rapidez, por meio de vídeos,
mas dificuldade na escrita. Aprende rápido
e tem até prazer em fazer pesquisas, mas não tem igual
interesse em escrever muito, ou ler livros. O ritmo da escrita não acompanha o ritmo do pensamento. Exemplo 03: Tem 07 anos, “cabeça” de adulto e reação emocional de uma criança de 02 anos
de idade. |
*Valorizar aptidões do aprendente, o que
ele gosta de pesquisar, de falar, e de fazer,
e fazer disso pontos de partida para trabalhar
outras áreas em que ele não esteja tão bem e precise melhorar, como a leitura e a escrita. Não rejeitar os
interesses dele, e não olhar para esses
interesses como fins em si mesmos, deixando-o estagnado. Esses interesses devem ser considerados e vistos como pontos de partida para seu desenvolvimento.
Assim, o aprendente se realizará
como pessoa, como acadêmico, e terá suporte
para desenvolver-se em competências
como a escrita. - Um exemplo: O
aprendente gosta de pets. Pode-se propor a ele um momento de pesquisa
(leitura) sobre como cuidar de pets (e, aqui, temos Ciências), e, num segundo
ato, levá-lo a produzir um folder informativo sobre (escrita). Essa atividade
pode, ainda, envolver, arte em desenho, pintura (...), manual ou
digital. *Ponderar sobre a cobrança de escrita e leitura, o que não significa deixar
de cobrar escrita e leitura! Procurar compreender seu |
|
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ritmo mais lento
de escrita e leitura não como mera preguiça, mas como mostra
da assincronia. Ressalte-se,
entretanto, que isso não significa deixar de cobrar escrita
e leitura! Daí a necessidade de se considerar suas
aptidões e capacidades e fazer das
mesmas pontos de partida para um
trabalho que trabalhe seus pontos mais fracos, como a escrita e a
leitura, para que ele se desenvolva. *Considerar que pode acontecer de o aprendente não ter o mesmo
alto desempenho em todas
as áreas ao mesmo tempo, de não ser
bom em tudo o tempo todo. Isso traz um olhar
qualitativo, realista sobre suas aptidões, capacidades, dificuldades e necessidades.
Mas atenção: Isso não significa acomodação
negativa. O que se intenciona é tirar-lhe
pressão demasiada, negativa, e não atuar contra
seu bem-estar, capacidades, potenciais. *Suporte psicológico, visando
à dimensão emocional-comportamental. |
Sobre-excitabilidade: Alta intensidade na forma de vivenciar uma ou mais dessas dimensões: dimensão psicomotora, dimensão |
A criança/o adolescente
ter muita energia, ser muito
falante, ter dificuldade de ficar quieta(o);
pode ser mais
sensível a luz,
ao barulho, sentir com mais intensidade certos cheiros, |
* Atentar para estímulos no ambiente, como
barulho. Cuidar de um ambiente
propício, que favoreça o bem-estar, a aprendizagem. |
sensorial, dimensão imaginativa, dimensão intelectual, dimensão emocional. |
sabores; gostar
mais de certas
texturas ou evitar especialmente algumas; a criança/o adolescente gostar muito de fantasiar;
gostar muito de estudar por conta própria, fazer pesquisas, fazer
análises, fazer reflexões filosóficas; crianças com alta intensidade emocional (sua dimensão emocional é bem intensa) (OLIVEIRA; BARBOSA, 2015). |
|
Importante ressaltar:
·
(Re)conhecer as aptidões do
aprendente, seus interesses. Ouvi-lo, conversar com ele, dando-lhe espaço, e
não meramente impondo uma agenda temática. Vislumbrar ações correlatas a essas
conversações, fazendo delas pontos de partida para ir conhecendo o aprendente
em seu perfil, interesses, capacidades, dificuldades e necessidades.
·
A escola não ser uma concorrente
dos interesses do aprendente, mas valorizá-los como pontos de partida para seu
programa de aprendizagem. E, aqui, mostrar, individualmente, como os conteúdos
trabalhados na escola podem ter relação com interesses do aprendente.
Quadro 2
As altas habilidades/superdotação (ahsd) têm diferentes
características, o que não significa que todas as pessoas ahsd tenham todas
elas. Cada pessoa é única.
Trago algumas características do
universo das altas habilidades/superdotação e suas implicações, positivas e
negativas. É preciso conhecer que uma mesma
característica de ahsd pode vir a trazer tanto implicação(ões) positiva(s) quanto negativa(s), o que evidencia a necessidade de que conheçamos melhor a temática das altas
habilidades, para que possamos compreender melhor, agir melhor com nossas
crianças/adolescente ahsd, pelo seu
bem-estar e desenvolvimento, pessoal, acadêmico, social. O quadro a seguir foi construído a partir de outro trazido no
livro Altas Habilidades/Superdotação – Rompendo as Barreiras do Anonimato, 2ª
edição, pela Fundação Catarinense de Educação Especial, 2016. Referido livro cita o pesquisador Ali (2001) ao
trazer esse quadro. Os trechos entre aspas foram extraídos do livro citado.
Aqueles que não estão em aspas, as dicas psicopedagógicas são por este
psicopedagogo.
Característica |
Implicação(ões)
positiva(s) |
Implicação(ões)
negativa(s) |
Dica(s) psicopedagógica(s) |
“Habilidade cognitiva avançada” |
Aprende
rápido |
“Sente-se entediado com as tarefas acadêmicas curriculares. Não gosta de tarefas que envolvem reprodução do conhecimento”. Embora saiba das respostas, faz as
atividades/tarefas escolares sem cuidar muito da letra, com desorganização. Não quer fazer atividades na sala de aula, tarefas
escolares. |
* Valorizar os conteúdos escolares, fazendo deles pontos de articulação, pontos de partida para
saberes outros, saberes
além, ao encontro de interesses, capacidades da criança. Não a esmo. Mas visando a competências e habilidades saudáveis ao seu processo de aprendizagem. - Que a escola invista em ressaltar possíveis relações entre
conteúdos escolares e aptidões temáticas do aprendente. -- Um exemplo: Mostrar que a matemática é fundamental em um sistema
de programação de jogos. |
“Habilidade para
processar informações rapidamente” |
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*Evitar repetição para
conteúdos já compreendidos. Adaptar atividades, compactando-as, |
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propondo-lhe atividades diferenciadas, com maior enriquecimento, com mais desafio. Essas atividades não devem ser só no âmbito da escrita, tampouco em grande quantidade. O aluno deve se realizar, desenvolver-se com elas,
e não se sentir sobrecarregado. *Ver junto ao
aluno atividades possíveis, que
tanto reconheçam seu potencial quanto o desenvolvam, capazes de trabalhar competências e habilidades que lhes são necessárias. - A Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
para o Ensino Fundamental – Séries Finais
é uma referência Fundamental, ao trazer competências e habilidades
como objetivos de aprendizagem, atuando como um parâmetro valioso, e um
denominador comum, ao cotemplar o aluno e ser do universo escolar. |
“Pensamento independente” |
“Tem grande
prazer na atividade intelectual. Gosta de realizar tarefas de modos diferentes”. |
“Ressente-se da rotina.
Parece ser rebelde”. Querer sempre impor
sua maneira de ver, fazer. Dificuldade em ouvir, discutir de maneira saudável. |
*Oportunizar a criança/ao adolescente momentos valorativos para sua expressividade: “O que você
tem a dizer?”, “Quais suas novidades?”, “O
que
tem estudado, pensado?”, “Quer discutir sobre
algo, um ouvindo o outro?”, “Tem
algo que queira mostrar
(das temáticas que gosta,
que mostre capacidades)?”, “Vamos fazer uma atividade diferente?”, “Vamos fazer algo em uma temática que você goste?
O que poderia ser? Eu tenho uma sugestão! E você, quer propor algo?”. |
“Intensa motivação” |
Tem alto envolvimento na aprendizagem,
mostra-se interessado, persistente. |
“Envolve-se em muitas atividades. Ressente-se de ser interrompido”. Pode vir
a começar várias coisas
e não terminar nenhuma. Procrastinar. Envolver-se com várias
coisas, mas sem
momento de foco qualitativos. |
*”Vamos nos organizar para
aproveitarmos bem, melhor
essas coisas legais
que você gosta? A gente vai organizando, dando foco e curtindo bem isso! Depois,
vemos outra coisa!”, “Viu como organizando dá pra
gente tirar um tempo mais especial pra curtir mais ainda coisas
legais que você gosta? Depois
a gente vê outra coisa, combinado?”. |
Criatividade |
Vislumbra diferentes possibilidades de fazer, interesse por criar. |
Adotar postura intransigente e querer, em intensidade negativa, danosa no convívio com o outro,
quebrar normas, não
admitir parâmetros. |
*Valorizar produções da criança/do adolescente. Oportunizar esses momentos,
como por meio de uma exposição realizada na escola para alunos séries
menores, que terão no aprendente a figura de um visitante, o que traz uma
figura de autoridade, faz dele um exemplo. |
·
Para quando se fala que a escola deve evitar
repetição para conteúdos já aprendidos, devendo adaptar atividades,
compactando-as, propor atividades diferenciadas, com maior enriquecimento, mais
desafio: Não precisa a escola se preocupar
em enviar muitos materiais.
O importante é o aprendente se sentir acolhido, acompanhado. Que se sinta bem, pessoal e academicamente. Há casos,
aliás, em que, mesmo querendo ajudar, e é louvável
o interesse da escola (!), o aluno com altas habilidades/superdotação tem um aumento
tão grande atividades, que, ao invés de um ganho, tem-se um aluno desestimulado, chateado,
até mesmo abandonando o interesse pelos estudos, e enquadrando-se
no que a literatura científica estuda como condição
underachievement condição de
baixa performance: o aluno tem altas habilidades/superdotação mas tem baixa performance ou mesmo muitos sérios
problemas na escola. Envio, em anexo, artigo científico
sobre.
Como se vê, as altas habilidades/superdotação (ahsd) não consistem em um universo homogêneo, onde todos os alunos ahsd tiram sempre nota 10 em tudo. Há mitos nessa temática que só atrapalham o reconhecimento e o devido atendimento desses alunos, trazendo impactos negativos nos âmbitos emocional, acadêmico, afetando, lá na frente, sua vida profissional. Felizmente, com o passar dos anos, estudos têm permitido conhecer melhor a condição ahsd. Assim, poderemos ajudar esses alunos!
Mitos no universo das
altas habilidades |
Todo ahsd só tira notas
bem altas em tudo. |
Esses alunos não precisam
de ajuda nenhuma, acompanhamento nenhum. |
O rendimento de um aluno
ahsd será sempre bem alto, pois suas capacidades não dependem de motivação,
estímulo. |
Fatores que podem
contribuir para um aluno ahsd ter baixo rendimento escolar |
“dificuldade de
adaptação ao ensino regular pouco desafiador” |
“pressão para se
adequar às normas” |
“isolamento social e dinâmica
familiar conflituosa, rígida e de altas expectativas” |
Ansiedade |
Perfeccionismo |
Baixa autoestima e autoconceito negativo |
Desorganização |
Estabelecimento de metas irreais |
“impossibilidade
de escolhas, a falta de desafios variados no contexto escolar e interesses
externos concorrentes”. Observação do psicopedagogo: Daí porque a escola não
ignorar saberes, aptidões do aluno, concorrendo com eles, mas sim fazer deles
meios de valorização do aluno e pontos de partida para uma rica positiva
aprendizagem para o mesmo. |
“poucas oportunidades de desenvolver
atividades criativas, ausência de desafios cognitivos e processo de avaliação
escolar autoritário” |
“influência
parental inadequada” |
“dificuldades de
relacionamento com pares” |
Importante
ressaltar |
“esses indivíduos
demonstram vulnerabilidades afetivas e emocionais” |
Motivação e autoconceito são muito
relevantes |
Fonte:
Artigo científico A condição underachievement em superdotação: definição e
características, autoria de Vanessa Ourofino e Denise Fleith. Disponível
em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v13n3/v13n3a16.pdf
(artigo cuja leitura indiquei no início deste material).
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